por Flávio Almeida
Olá, voltamos aqui com o papo de banda e dessa vez, a conversa foi com Sr. Bernardo Berbert, guitarra e vocal da incrível banda Malvina do Rio de Janeiro, mais especificamente Nova Friburgo. Fizemos um show juntos em Dezembro/ 2019 e estreitamos o papo, o que gerou essa entrevista aqui. Dá uma conferida aqui e já adianto, esses caras são pulso firme e assistir a um show deles é o que você deve fazer logo após essa leitura e não, não se preocupem porque eles vão até vocês, afinal caem na estrada mesmo e mandam brasa! FAlmeida - Salve salve Bernardo, que satisfação trocar essa ideia aqui com você e poder dividir com os leitores do Seguimos Fortes! Para começar aqui, o Seguimos Fortes trata basicamente do Underground que existe no próprio Underground, se é que me entende. Nos conte como começou a Malvina e onde exatamente vocês querem estar. Bernardo B. - A satisfação é minha, valorizo a iniciativa! O Malvina começou quando éramos muito moleques, a gente morava em Nova Friburgo, interior do Rio de Janeiro. Estávamos há um tempo tentando arrumar uma galera pra montar uma banda, tínhamos tido alguns projetos que se desmancharam - em um momento parecia que não havia gente com quem pudéssemos nos juntar, éramos muito mais novos que os caras das bandas que estavam na ativa, tínhamos 13 anos. Nessa época estivemos pra ser expulsos do colégio e fomos cada um pra uma escola diferente, meu irmão conheceu o Carlos na dele, guitarrista de uma banda de punk rock que tinha a nossa idade, rolou uma química forte que inspirou os primeiros sons e a iniciativa de chamar a nossa amiga Bruna pra tocar bateria, isso era 2003. De lá até aqui fizemos várias demos, tocamos bastante ao vivo e gravamos os nossos discos, é mais ou menos o que temos em mente com o Malvina, tem muito lugar que a gente quer conhecer e várias músicas novas. FAlmeida - O primeiro registro da Malvina é um Full de 2010, o Claustro (estou certo?) metade em Inglês e metade em Português. Aqui vocês chegam já mostrando quem são, velocidade, força, coerência e melodias, tudo isso muito bem alinhado com os temas tratados em cada canção. Ouvindo o disco, tenho a impressão que vocês já sabiam o que queriam quando fizeram esse álbum. Nos conte como foi esse processo e se fazê-lo meio inglês e meio português foi um teste para saber por onde seguir no futuro que sucedeu. Bernardo B. - Exatamente, o Claustro foi lançado em 2010 e é o nosso primeiro disco. Bem rápido e mais melódico, comparado aos trabalhos posteriores. Esse foi um álbum bem espontâneo que resolvemos fazer numa fase em que a banda já tinha resolvido começar a cantar em inglês - as primeiras demos eram em português. Tivemos uma ideia mais clara do 'Claustro' depois de algumas sessões de gravação, ainda não tínhamos feito nenhuma pré e algumas músicas nunca tinham sido tocadas ao vivo. Quanto à divisão, esse foi mais um recurso que usamos na época para definir a dinâmica do disco. FAlmeida - É característica de vocês a velocidade e dinâmica frenética das canções. Nos conte qual é a história de vocês com a música, tecnicamente falando. Bernardo B. - Eu e meu irmão começamos a tocar bem cedo, com mais ou menos dez anos. Tivemos algumas aulas onde aprendemos os acordes básicos, mas a nossa escola foi a partir dos discos, botando pra tocar e tirando de ouvido, é dessa forma que tocamos até hoje. O pai do Renato era baterista, então ele teve o contato desde criança, essa bagagem foi crucial. Quando vimos o Renato tocando foi com uma banda de Metal, mais tarde ele entraria no Malvina. A gente procurou explorar essa mistura de vertentes a partir daí e com o tempo fomos nos aprofundando. Passamos os primeiros anos ensaiando em um sítio isolado, tínhamos tempo e liberdade pra testar várias coisas diferentes, isso contribuiu muito pro desenvolvimento do som do Malvina, estávamos sempre muito entrosados e com ideias novas. FAlmeida - Já são 2 full, 1 EP e 1 single, correto? Como vocês enxergam a obra da Malvina? Disco ou EP ou Single? Vocês entram nessa ou preferem trabalhar um álbum como uma obra que não se pode contar em apenas uma canção? Bernardo B. - São 2 álbuns, 2 EPs e um single, cada um dos registros tem uma atmosfera diferente, que reflete bastante nosso momento da época. Como crescemos a partir dos discos, damos bastante valor ao Full, essa é uma forma de arte muito completa, que abre espaço para quase todas as formas de expressão, nesse ponto eu diria que somos entusiastas do disco físico, mas estamos sempre acompanhando os lançamentos digitais. Sobre o single, ele é fundamental em um release, especialmente hoje com tanta coisa saindo ao mesmo tempo, há a vantagem de poder trabalhá-los separadamente ao mesmo tempo em que se fortalece o lançamento do álbum. FAlmeida - Cair na estrada e rodar por onde vocês rodam é algo que é desgastante e faz muita gente desistir depois de um tempo. O que fazer para continuarem motivados e passar por cima de episódios como falta de profissionalismo de contratantes, casas de shows com infraestrutura precária e manter acesa a chama de tentar sempre informar, educar e se divertir através da música? Bernardo B. - De fato, já tivemos diversas formações diferentes e olhando ao redor vemos que é bem raro uma banda passar incólume por esse teste. A maneira que eu tenho de lidar com isso é me imaginar sem tocar, é rápida a conclusão de que seria ainda pior. FAlmeida - E nesse lance de estrada, estrada e estrada, os instrumentos muitas vezes se deterioram e podem nos deixar na mão. Como vocês cuidam dos instrumentos antes de sair em turnê e obviamente, como se estruturam logisticamente para carregar menos coisas possível? Bernardo B. - Esse é o desafio de toda tour, sempre falta espaço. A gente toma bastante cuidado com os instrumentos de corda porque tocamos em uma afinação alternativa, é mais difícil de substituir em cima da hora, as cordas vão sempre novas e sempre que possível usamos hardcase. Tudo da banda - merch, zines, banner - vai em uma única mala e cada um tem uma mochila com tudo que precisa pra tour. FAlmeida - Com todas as dificuldades que uma banda independente tem para construir uma obra e essa mudança na forma como se consome música no mundo, qual o papel de um selo/ gravadora em tempos atuais, para bandas como a Malvina, que tem uma atividade regular? Qual é a opinião de vocês sobre isso? Bernardo B. - O selo tem um papel muito importante, decisivo no trabalho do artista. Existem algumas estratégias para otimizar um lançamento, um selo que trabalha de forma inteligente naturalmente vai procurar meios de divulgar um release, já que ele ganha com as reproduções, dessa forma o artista alimenta o selo e vice versa. Existe uma forma de separar um lançamento por região, dessa maneira é possível trabalhar com labels diferentes em um mesmo release, cada uma focada em um país ou área, dependendo da situação, é uma forma de fortalecer mais ainda a divulgação. Eu percebo que existe uma confusão por parte das bandas em relação a ideia de assinar com um selo. Compor músicas, escrever as letras e ensaiar até fechar um disco ou EP dá um trabalho gigantesco, é muito tempo e grana envolvido, depois de todo esse processo o mínimo que se espera é uma distribuição com o mínimo de planejamento, com plano de divulgação e que os repasses sejam feitos aos artistas. Muitas bandas estão correndo pra labels que não dão nenhum retorno, como se assinar com um selo fosse uma conquista, na verdade é preciso ver o que o selo fará pela banda já que qualquer um pode subir um disco no Spotify. FAlmeida - O último disco da Malvina é o Hybrid War, lançado em 2019. Analistas políticos como Andrew Korybko por exemplo e que inclusive é autor de Guerras Híbridas, denunciam esse tipo de guerra manipulada pelos Estados Unidos em prol de seus interesses comerciais, onde rumos políticos, golpes, prisões injustas entre outros, culminam para a ascensão de um aliado que idolatra a América ao poder. Esse é um tema complexo e vocês conseguiram retratar muito bem no meu ponto de vista mas, nos conte como foi a recepção e repercussão desse álbum. Vocês tem que explicá-lo constantemente? Perderam alguns fãs que acham que não se deve misturar música e política (rsrsrs)? Bernardo B. - O conceito de Guerra Híbrida ainda é pouco disseminado no Brasil, frequentemente nos vemos explicando tanto o conceito quanto o álbum. Essa abordagem do golpe é crucial para entender tudo desde o início, e esclarecer alguns episódios que permaneciam incompreendidos. A recepção do disco nos surpreendeu muito, tanto aqui quanto em países da Europa e da América do Norte, recebemos resenhas do mundo todo, todas elas muito positivas. A gente pegou no cerne do golpe no calor do momento, logo após a eleição do Bolsonaro, certamente essa resposta foi influenciada pelo timming do momento. Sobre a última pergunta, o Hybrid War foi um grande filtro. FAlmeida - O Hybrid War foi mixado e masterizado no Blasting Room Studios no Colorado/ USA por ninguém mais ninguém menos que Jason Livermore (pô não vou citar aqui a discografia dele, deem uma lida nos discos que vocês tem na estante). Como foi o contato com ele e como foi poder fazer esse trampo em um lugar que respira punk/ hardcore? Bernardo B. - Essa foi umas das experiências mais loucas de toda a nossa vida, todos aqueles discos clássicos na parede do corredor logo na entrada do estúdio. Não contávamos em mixar o disco junto com ele, não tava programado, íamos só fazer o recall na última sessão. No dia seguinte em que chegamos em Fort Collins fomos surpreendidos pela ligação do Chris convocando a gente pro primeiro dia de mixagem, o Jason achou melhor a gente seguir o resto dos dias com ele na mix do disco. Foi um aprendizado colossal, ele é um monstro, rápido e paciente, muita experiência, deu toda a atenção aos mínimos detalhes. Nos intervalos entre as sessões a gente trocou bastante som e ideia, ele tava bem interessado na música brasileira, a gente nas gravações e mixagens de alguns discos que são referência. FAlmeida - Para finalizar aqui Bernardo, eu queria dizer que vocês são umas das bandas mais técnicas e coerentes que já dividi o palco e isso inclui gente que se diz grande aí, em uma cena que talvez nem exista! Obrigado por topar em bater esse papo aqui com a gente e use o espaço aqui para mandar o recado para o leitor e compartilhar conosco os planos da Malvina para com esse disco que ainda está fresco! Bernardo B. - Eu que agradeço, parabéns demais pelo trabalho, espero ver vocês logo! O Malvina vai estar com o Garotos Podres e o Statues on Fire no dia 7 de março, é um dos primeiros shows da volta do Hangar, vai ser bem foda ver a casa cheia, aproveito aqui pra chamar todo mundo pra chegar junto! FAlmeida - É isso, e assim acabamos aqui mais um episódio da primeira temporada do Papo de Bandas, quadro de entrevistas escritas aqui do Seguimos Fortes! A banda Malvina está numa correria danada por aí afora, fazendo shows frenéticos por todos os lugares possíveis! Fiquem ligados na agenda dos caras e caso eles passem por perto, vá assistir que tenho certeza que ficarão impressionados com a velocidade, coerência e peso desse power trio do Rio de Janeiro. Como sugestão, indico as músicas Hybrid War e Subversão; a primeira abre o último álbum dos dos caras de 2019 de mesmo nome. Sugiro dar um lida sobre o tema hybrid war antes de ouvir a canção e posterior entrar no mesmo contexto e vibe dos caras! Baita trampo, baita música, baita letra e sem contar com a finalização de Jason Livermore. A outra música, é do Claustro de 2010, cantada em português. A banda deixava já claro o seu posicionamento mas vem com a característica que os acompanha, e que acho sensacional; a velocidade e coerência estão explícitos aqui. Ainda há espaço para um reggae/ ska no meio da música!
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